Tudo
o que posso dizer é que estou louco por ti. Tentei escrever uma carta e não
consegui. Estou constantemente a escrever-te... Na minha cabeça, e os dias
passam, e eu imagino o que pensarás. Espero impacientemente por te ver. Falta
tanto para terça-feira! E não só terça-feira... Imagino quando poderás ficar
uma noite... Quando te poderei ter durante mais tempo... Atormenta-me ver-te só
por algumas horas e, depois, ter de abdicar de ti. Quando te vejo, tudo o que
queria dizer desaparece... O tempo é tão precioso e as palavras supérfluas...
Mas fazes-me tão feliz... porque eu consigo falar contigo. Adoro o teu
brilhantismo, as tuas preparações para o voo, as tuas pernas como um torno, o
calor no meio das tuas pernas. Sim, Anais, quero desmascarar-te. Sou demasiado
galante contigo. Quero olhar para ti longa e ardentemente, pegar no teu
vestido, acariciar-te, examinar-te. Sabes que tenho olhado escassamente para
ti? Ainda há demasiado sagrado agarrado a ti.
A tua carta... Ah, estas moscas! Fazes-me sorrir. E fazes-me adorar-te também. É verdade, não te dou o devido valor. É verdade. Mas eu nunca disse que não me dás o devido valor. Acho que deve haver um erro no teu inglês. Isso seria demasiado egoísta para eu dizer.
Anais, não sei como expressar-te o que sinto. Vivo numa expectação constante. Tu chegas e o tempo escoa-se como num sonho. É só quando partes que eu entendo completamente a tua presença. E, então, é tarde de mais. Atordoas-me.
Tento imaginar a tua vida em Louveciennes, mas não consigo. Walter Pach? Um sonho bêbedo... E além disso, não gosto dele; o porquê não sei dizer. O teu livro? Também parece irreal. Só quando chegas e olho para ti é que o quadro fica mais claro. Mas partes tão rapidamente... Não sei o que pensar. Sim, vejo claramente a lenda de Pushkin. Vejo-te na minha mente sentada nesse trono, com joias à volta do pescoço, sandálias, grandes anéis, unhas pintadas, estranha voz espanhola, a viver uma espécie de mentira que não é exatamente uma mentira mas um conto de fadas.
Vesti esta noite as minhas calças de bombazina e reparei que estavam manchadas. Mas juro pela minha vida que não consigo associar a mancha à princesa em Louveciennes que priva com guitarristas, poetas, tenores e críticos. Não me esforcei muito para tirar a mancha. Vi-te entrar na lavandaria e encostar a tua cabeça no meu ombro. Não consigo ver-te a escrever «An Unprofessional Study».
Isto está um bocadinho bêbedo, Anais. Estou a dizer para mim «aqui está a primeira mulher com quem posso ser absolutamente sincero». Lembro-me de dizeres: «Tu podias enganar-me. Eu não o saberia». Quando passeio pelos «boulevards» e penso nisso... Não posso enganar-te... E no entanto gostaria de fazê-lo. Quero dizer que nunca posso ser absolutamente leal... Não está em mim. Adoro mulheres, ou a vida, demasiado... Não sei de que gosto mais. Mas ri, Anais, adoro ouvir-te rir. És a única mulher que tem tido um sentido de alegria, uma sábia tolerância... Já não mais pareces querer fazer com que eu te traia. Amo-te por isso. E por que fazes isso? Amor? Oh, é maravilhoso amar e ser livre ao mesmo tempo.
Não sei o que esperar de ti, mas é algo parecido com um milagre. Vou exigir tudo de ti... Mesmo o impossível, porque tu o encorajas. És realmente forte. Até gosto da tua falsidade, da tua traição. Parece-me aristocrática. (Será que "aristocrática" soa mal na minha boca?)
Sim, Anais, estava a pensar em como posso trair-te, mas não consigo. Quero-te. Quero despir-te, vulgarizar-te um pouco... Ah, não sei o que digo. Estou um bocado bêbedo porque tu não estás aqui. Gostaria de bater palmas e... «voilà»: Anais! Quero ter-te, usar-te. Quero fazer amor contigo, ensinar-te coisas. Não, não te dou o devido valor... Deus queira que não! Talvez até queira humilhar-te um pouco... Porquê, porquê? Por que é que não me ajoelho e te adoro? Não consigo. Amo-te risonhamente.
Gostas disso?
Querida Anais, sou tantas coisas. Tu só vês as coisas boas agora... Ou, pelo menos, levaste-me a pensar isso. Quero-te pelo menos durante um dia inteiro. Quero ir a sítios contigo... Possuir-te. Não sabes o quão insaciável sou. Ou o quão tortuoso. Ou o quão egoísta!
Tenho-me portado bem contigo. Mas aviso-te de que não sou um anjo. Penso principalmente que estou um pouco bêbedo. Amo-te. Vou para a cama agora... É demasiado doloroso permanecer acordado. Amo-te. Sou insaciável. Vou pedir-te para fazeres o impossível. O quê, não sei. Provavelmente dir-me-ás. És mais rápida do que eu. Adoro a tua ***, Anais... Põe-me louco. E o modo como dizes o meu nome! Deus, é irreal. Ouve, estou muito bêbedo. Dói-me estar aqui sozinho. Preciso de ti. Posso dizer-te qualquer coisa? Posso, não posso?
Vem depressa então, e faz amor comigo. Explode comigo. Enrola as tuas pernas à minha volta. Aquece-me.
Henry Miller, in "Carta de Henry Miller a Anais Nin, 1932"
A tua carta... Ah, estas moscas! Fazes-me sorrir. E fazes-me adorar-te também. É verdade, não te dou o devido valor. É verdade. Mas eu nunca disse que não me dás o devido valor. Acho que deve haver um erro no teu inglês. Isso seria demasiado egoísta para eu dizer.
Anais, não sei como expressar-te o que sinto. Vivo numa expectação constante. Tu chegas e o tempo escoa-se como num sonho. É só quando partes que eu entendo completamente a tua presença. E, então, é tarde de mais. Atordoas-me.
Tento imaginar a tua vida em Louveciennes, mas não consigo. Walter Pach? Um sonho bêbedo... E além disso, não gosto dele; o porquê não sei dizer. O teu livro? Também parece irreal. Só quando chegas e olho para ti é que o quadro fica mais claro. Mas partes tão rapidamente... Não sei o que pensar. Sim, vejo claramente a lenda de Pushkin. Vejo-te na minha mente sentada nesse trono, com joias à volta do pescoço, sandálias, grandes anéis, unhas pintadas, estranha voz espanhola, a viver uma espécie de mentira que não é exatamente uma mentira mas um conto de fadas.
Vesti esta noite as minhas calças de bombazina e reparei que estavam manchadas. Mas juro pela minha vida que não consigo associar a mancha à princesa em Louveciennes que priva com guitarristas, poetas, tenores e críticos. Não me esforcei muito para tirar a mancha. Vi-te entrar na lavandaria e encostar a tua cabeça no meu ombro. Não consigo ver-te a escrever «An Unprofessional Study».
Isto está um bocadinho bêbedo, Anais. Estou a dizer para mim «aqui está a primeira mulher com quem posso ser absolutamente sincero». Lembro-me de dizeres: «Tu podias enganar-me. Eu não o saberia». Quando passeio pelos «boulevards» e penso nisso... Não posso enganar-te... E no entanto gostaria de fazê-lo. Quero dizer que nunca posso ser absolutamente leal... Não está em mim. Adoro mulheres, ou a vida, demasiado... Não sei de que gosto mais. Mas ri, Anais, adoro ouvir-te rir. És a única mulher que tem tido um sentido de alegria, uma sábia tolerância... Já não mais pareces querer fazer com que eu te traia. Amo-te por isso. E por que fazes isso? Amor? Oh, é maravilhoso amar e ser livre ao mesmo tempo.
Não sei o que esperar de ti, mas é algo parecido com um milagre. Vou exigir tudo de ti... Mesmo o impossível, porque tu o encorajas. És realmente forte. Até gosto da tua falsidade, da tua traição. Parece-me aristocrática. (Será que "aristocrática" soa mal na minha boca?)
Sim, Anais, estava a pensar em como posso trair-te, mas não consigo. Quero-te. Quero despir-te, vulgarizar-te um pouco... Ah, não sei o que digo. Estou um bocado bêbedo porque tu não estás aqui. Gostaria de bater palmas e... «voilà»: Anais! Quero ter-te, usar-te. Quero fazer amor contigo, ensinar-te coisas. Não, não te dou o devido valor... Deus queira que não! Talvez até queira humilhar-te um pouco... Porquê, porquê? Por que é que não me ajoelho e te adoro? Não consigo. Amo-te risonhamente.
Gostas disso?
Querida Anais, sou tantas coisas. Tu só vês as coisas boas agora... Ou, pelo menos, levaste-me a pensar isso. Quero-te pelo menos durante um dia inteiro. Quero ir a sítios contigo... Possuir-te. Não sabes o quão insaciável sou. Ou o quão tortuoso. Ou o quão egoísta!
Tenho-me portado bem contigo. Mas aviso-te de que não sou um anjo. Penso principalmente que estou um pouco bêbedo. Amo-te. Vou para a cama agora... É demasiado doloroso permanecer acordado. Amo-te. Sou insaciável. Vou pedir-te para fazeres o impossível. O quê, não sei. Provavelmente dir-me-ás. És mais rápida do que eu. Adoro a tua ***, Anais... Põe-me louco. E o modo como dizes o meu nome! Deus, é irreal. Ouve, estou muito bêbedo. Dói-me estar aqui sozinho. Preciso de ti. Posso dizer-te qualquer coisa? Posso, não posso?
Vem depressa então, e faz amor comigo. Explode comigo. Enrola as tuas pernas à minha volta. Aquece-me.
Henry Miller, in "Carta de Henry Miller a Anais Nin, 1932"
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